segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

Na história da Anadia existem períodos bem documentados e estudados, mas também existem outros períodos e acontecimentos que se encontram pouco documentados e consequentemente pouco estudados.

Nos períodos mais remotos da história, nomeadamente no Paleolítico e no Neolítico, os vestígios são muito escassos e alguns necessitam mesmo de ser analisados e comprovados. Quanto aos vestígios referentes ao Paleolítico encontraram-se nas povoações dos Carvalhais, Vila Nova de Monsarros e Monte Castro (Anadia), onde também se encontrou vestígios da Idade do Ferro. Os vestígios referentes ao Neolítico encontraram-se na povoação da Moita. O período da ocupação romana encontra-se, efectivamente, bem documentado existem vestígios de cerâmica e cobertura doméstica, dispersos por todo o concelho: Avelãs de Caminho, Avelãs de Cima, Aguim, Vilarinho do Bairro, Óis do Bairro, São Lourenço do Bairro, Mongofores, aparecendo, porém com mais incidência, na Anadia e Sangalhos.

Mas se estes vestígios encontrados não suscitam dúvidas, o mesmo não acontece em relação ao traçado da via, do mesmo período, que ligava Cale (Porto) a Olisipo (Lisboa). Para alguns investigadores a referida via passava dentro do concelho, enquanto para outros investigadores a via passaria ao lado do concelho. A verdade é que a referida via era de extrema importância a nível de comunicação norte-sul, assim como, na comercialização dos vinhos da região que já se efectuava na altura.

Os documentos que comprovam a comercialização do vinho, só surgiram na Idade Média, nomeadamente, actos contratuais, testamentos e doações, alguns destes documentos apresentam-se em fontes tão ricas como iluminuras. Desta forma existe referência à produção da vinha nas povoações de Arcos, Mongofores, (séculos XII e XIII), assim como, no foral de Ferreiros, Fontemanha, e Vale de Avim (Maio 1210. Como o vinho era e continua a ser um produto comercializável, as instituições religiosas como Santa Cruz de Coimbra, Lorvão e Vacariça , que detinham senhorios na região, usavam-no como forma de pagamento das rendas fundiárias e impostos, assim como, incentivaram a sua produção na região.

A importância da já referida via que ligava o norte ao sul, assim como, a comercialização do vinho e das uvas deu origem a uma lenda, que se cruza com a origem toponímica da localidade de Anadia.

Deste modo, segundo a lenda era uso encontrar-se junto a referida via uma rica proprietária a vender as suas uvas chamada Ana Dias, da junção do nome da famosa vendedora surgiu o nome Anadia, para designar a localidade. Porém a lenda não esclarece quanto ao traçado da via, porque não refere se a via passava ao lado ou dentro da localidade, alimentando desta forma a dúvida quanto ao assunto.

A forma mais antiga encontrada para designar o referido povoado é “Nadia”, que surge num documento que esclarece as confrontações de uma herdade de Monsarros, no documento pode-se ler “dividit cum Quintanela et per illa Nadia et inde per illa ecllesia Santi Martini ...Dividit e alia parte cum villanova”, analisando, Quintanela é na atualidade Quintela da Igreja, um lugar da freguesia da Moita, a “...ecllesia de Santi Martini..” é a igreja do povoado com o mesmo nome, que fica próximo de Monsarros, e “villanova” é Vila Nova de Monsarros , logo, “illa Nadia” só poderá ser  Anadia. A palavra “Nadia” deriva do latim “nativa” que significa nascente ou fonte natural, do lado norte de Anadia brotavam fontes ou nascentes naturais. Num documento de 1140 que se refere ao couto de Aguim é visível a designação actual de Anadia para se referirem ao povoado.

A documentação da Idade Média permite-nos conhecer a dinâmica existente, quanto à consolidação e surgimento de povoados, no atual concelho de Anadia. Assim não remetendo para o período anterior ao nascimento do reino temos: São Lourenço do Bairro (883), Arcos (943), Sangalhos (957), Vila Nova de Monsarros (1064), Levira (1020), Vilarinho do Bairro (1020), Samel (1020), Moita (1064), Tamengos (1064), Horta (1064), Anadia (1084), Quintela (1089), Avelãs de Baixo (1138), Figueira (1138), Boialvo (1138), Ferreiros (1138), Ancas (1143), Mogofores (1143), Sá (1143) e Paredes do Bairro (1143). E no entanto de referir que os povoados de Ferreiros, Fontemanha e Vale de Avim, povoados que actualmente integram a freguesia da Moita, receberam carta de foral de D. Sancho em 1210.

A fundação do concelho da Anadia remonta ao século XVI, quando D. Manuel no âmbito de uma reforma administrativa, outorga várias cartas de foral, Anadia recebeu a sua carta de foral dada pelo monarca em Lisboa (1514).

No espaço que actualmente é o concelho da Anadia foram ainda criados os concelhos de Avelãs de Caminho, Avelãs de Cima, Vilarinho do Bairro, Aguim, Sangalhos, Pereiro, Boialvo e Vila Nova de Monsarros. Em 1519, foi concedido foral a Paredes do Bairro, e no ano seguinte, a Óis do Bairro e Mogofores.

Ao poder do concelhio somaram-se outras jurisdições, como a Universidade de Coimbra, à qual D. João III concedeu Anadia, que esteve sob o domínio da instituição até as guerras liberais. Por sua vez a Coroa exercia o seu domínio em Avelãs de Caminho e Sangalhos, enquanto que o bispo de Coimbra exerceu o seu domínioem Mongofores e Óis do Bairro, e o cabido da Sé de Coimbra em Aguim, assim como, o bispo de Santa Cruz de Coimbra em Pereiro e Sangalhos. Este último povoado a partir de 1338 passou a estar sob a jurisdição da abadessa de Santa Clara de Coimbra.

Quanto às famílias nobres também dispunham da sua influência em alguns povoados, como Avelãs de Cima, São Lourenço do Bairro, Vilarinho do Bairro, Carvalhais, Ferreiros, Fontemanha e Vale de Avim. No que respeita a Anadia, a família que mais se destacou foi a Sá de Melo, Aires de Sá e Melo (1690? /1786), casado duas vezes a primeira foi Sebastiana Inês de Melo de Sousa e Cáceres, com quem teve duas filhas, e a sua segunda esposa foi D. Maria Antónia de Sá Pereira Menezes de quem teve João Rodrigues de Sá
e Melo (Visconde de Anadia). D Aires Sá de Melo exerceu diversos cargos para a casa real, como o de secretário adjunto do marquês de Pombal, secretário dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, conselheiro do Conselho da Fazenda de capa e espada, e embaixador em Madrid. Devido ao prestígio alcançado por este, a rainha D. Maria I, concedeu-lhe o título de visconde de Anadia por carta de 8 de Maio de 1786, ao seu filho. Posteriormente, a mesma rainha viria a conceder a mesma pessoa o título de conde de Anadia, por carta de 17 de Dezembro de 1808.

Na década de trinta do século XVI, surgem novas alterações administrativas, em que se verificou uma nova divisão dos concelhos existentes, que pertenciam quase na totalidade a comarca da Estremadura, excepto Avelãs de Cima e Ferreiros que pertencia a comarca da Beira. Deste modo foram criadas duas novas comarcas, a 12 de Março de 1533 foi criada a comarca de Coimbra , assim, Aguim, Vila Nova de Monsarros e Paredes do Bairro passaram a fazer parte desta nova comarca. E no ano seguinte, a 20 de Dezembro foi criada a comarca de Aveiro, da qual passa a fazer parte, Anadia, Avelãs de Caminho, Ferreiros, Pereiro, Sangalhos, São Lourenço do Bairro e Vilarinho do Bairro.

A configuração da região sofre novamente alterações no século XIX, Sangalhos e Oliveira do Bairro foram unidas na década de vinte e trinta. A 28 de Abril de 1833, o concelho de Avelãs de Caminho era composto por, Anadia, Paredes do Bairro e Pereiro. Com efeito, a 18 de Julho de 1835, ainda subsistiam os concelhos de Aguim, Avelãs de Caminho, Avelãs de Cima, Ferreiros, Mogofores, Óis do Bairro, Sangalhos, São Lourenço do Bairro, Vilarinho do Bairro e Vila Nova de Monsarros. O decreto de 6 de Novembro de 1836 trouxe novas transformações, ao estipular a existência de dois concelhos, o de Anadia, o qual passava a ser composto pelas freguesias de Arcos, Moita, Mogofores, Avelãs de Caminho, Avelãs de Cima, enquanto o concelho de São Lourenço do Bairro era composto
pela freguesia de São Lourenço, Sangalhos, Óis do Bairro, Vilarinho do Bairro e Troviscal.
A 4 de Julho de 1837, o concelho da Anadia sofreu novamente transformações, com a anexação de uma nova freguesia Vila Nova de Monsarros, que foi subtraída ao concelho da Mealhada. Posteriormente, a 31 de Dezembro de 1853 verificou-se a mesma situação com Tamengos, que foi anexado ao concelho da Anadia e subtraída ao da Mealhada.

O concelho de Anadia foi ainda ampliado com a freguesia do Troviscal que pertencia a São Lourenço, ao qual se somou a freguesia de Ancas. A lei administrativa de 26 de Junho de 1867 anexou ao concelho de Anadia, Oliveira do Bairro, assim como a paróquia do Troviscal e Mamarrosa que passaram a ser uma freguesia civil e a fazer parte do concelho de Anadia. Uma nova legislação veio alterar a anterior, que fez com que o concelho de Anadia ficasse com a configuração anterior.

Em 1867, outras polémicas se levantaram desta vez entre o concelho da Anadia e o da Mealhada, devido ao projecto de reorganização dos concelhos levantou a questão de qual destes dois concelhos deveria ser a cabeça da comarca, segundo Alexandre Seabra (1881-1891), não se tratava de uma questão de identidade municipal, mas de benefícios materiais.

A questão chegou ao Monarca, sob a forma de um abaixo –assinado por parte dos defensores de Anadia. O problema foi solucionado de forma pacífica ao ser tudo incorporado na Bairrada E Anadia que possuía um papel mais significativo no território designado de Bairrada ficou como cabeça de comarca de um concelho com 3800 fogos, pagava de contribuição o dobro da Mealhada, mas possuía casa da comarca e tribunal como poucas comarcas rurais na época e uma cadeia melhor que Águeda. A 21 de Novembro de 1895 o concelho de Oliveira do Bairro é extinto e o seu território dividido pelo conselho da Anadia e Águeda, esta configuração durou até a 1898. No século XX criaram-se três novas freguesias, Amoreira da Gândara (1928), Paredes do Bairro (1985) e Aguim (1989).

A nível eclesiástico a primeira alteração ocorreu a 12 de Abril de 1774 com a criação da diocese de Aveiro que acolheu as povoações de Ancas, Óis do Bairro, Sangalhos, São Lourenço do Bairro e Vilarinho do Bairro, que anteriormente pertenciam a diocese de Coimbra. Em 1859 estas povoações passaram a pertencer ao arcebispado de Vilarinho do Bairro, extinto em 1881, data em que regressaram a diocese de Coimbra. A diocese de Aveiro viria a ser restaurada a 24 de Agosto de 1938, e passou a acolher dez concelhos entre eles, o concelho da Anadia.

Paralelamente, as alterações administrativas que marcaram a história da região outros factos marcaram esta região, nomeadamente, os movimentos anti-senhoriais que se fizeram sentir no final

Antigo Regime, e que viram a culminar no início do século XIX.
O século XIX ficou marcado pelas Invasões Francesas, a 29 de Setembro de 1810, as tropas do General Massena, após a derrota no Buçaco dirigiram-se para a Anadia, onde a freguesia da Moita foi quem mais sofreu o poderio francês, que entre 30 de Setembro e 4 de Outubro de 1810, viu as tropas francesas roubaram e destruíram muitas culturas.

O período das Invasões Francesas ficou tão bem marcado, ao ponto de cento e cinquenta anos ainda se relatar que no referido período das invasões, ter sido enterrado um tesouro na Quinta do Ortigão (Anadia), com a morte do seu proprietário, Joaquim Rodrigues Campos, em 1847, pelas milícias cabralistas o tesouro tornou-se irrecuperável.

Todo o concelho de Anadia viveu de forma intensa a actividade política do século XIX, as lutas entre liberais e absolutistas, uma vez que as duas fracções possuíam apoiantes no concelho, o que conduziu a diversos acontecimentos normais para o momento conturbados da época.

Até a século XIX o concelho teve más acessibilidades e falta de meios de comunicação. Em 1829 foi proposto o que o Jornal de
Coimbra tinha proposto anos antes, o encadeamento do rio Cértima, de modo a facilitar o escoamento dos vinhos da Bairrada por meio do porto de Aveiro.

Na década de 50 do século XIX a principal preocupação era criar no concelho boas acessibilidades, a 21 de Fevereiro de 1854 a Câmara Municipal solicitou uma estrada entre Aveiro e a Bairrada, numa altura em que a estrada real Porto–Lisboa necessitava de obras assim como as pontes que serviam o concelho da Anadia, uma vez que, em 1867 a esmagadora maioria das pontes existentes era de madeira.

O primeiro comboio da linha do norte passou no concelho de Anadia em 1864, e o percurso da linha-férrea foi o percurso que telégrafo eléctrico viria a usar numa fase inicial. A estação do telégrafo chegou a sede de concelho, em 1876, numa altura em que no País existia aproximadamente 150 estações de telégrafos. Em relação ao telefone verifica-se o mesmo que se verifica em relação ao telégrafo não existe muita documentação que comprove a sua chegada ao concelho.

A iluminação pública numa primeira fase, em 1882, limitou-se ao centro da vila, e o orçamento de 1892, contabilizava as despesas inerentes à iluminação do centro da vila. O combustível usado para o efeito, em 1887, era o petróleo que se manteve até aos inícios do século XX. Quanto à luz eléctrica a Curia foi a primeira povoação do concelho a beneficiar deste bem, em 1913, sendo que a electricidade demorou 15 anos para ser alargada ao restante concelho.

No século XIX verificou-se um desenvolvimento da imprensa local, no ano de 1888, nasceram no concelho vários periódicos, uns com uma existência mais duradoura que outros, assim uns
sobreviveram anos, enquanto outros sobreviveram décadas. A título de exemplo saliento o Jornal da Anadia, nasceu a 21 de Maio de 1888, foi o primeiro periódico, fundado por Artur de Campos. Durante os 30 anos que este jornal foi impresso outros jornais surgiram, destaco: A Bairrada, Ecos da Anadia (1892) e Ideal da Bairrada  (1898).

No total, neste primeiro período surgiram sete periódicos, num espaço de tempo e geográfico, que não podemos considerar muito amplo, mas de grande desenvolvimento da imprensa, pelo menos no concelho de Anadia.

A Anadia teve no meio século que antecedeu a República três figuras de grande relevo que aproximavam o concelho do poder central: António Luís de Seabra (1798-1895), Alexandre de Seabra (1818-1891) e José Luciano de Castro (1842-1914). Como defensores dos interesses do concelho perante o poder central a população da região idolatrava-os.

Alexandre de Seabra foi jurisconsulto, formou-se na Universidade de Coimbra, em advogado, foi o autor do Código do Processo Civil.  Alexandre Seabra de Castro teve uma filha que casou com José  Luciano de Castro, que era natural de dos arredores de Aveiro. José Luciano de Castro marcou o panorama político nacional. Em 1853 foi nomeado deputado pelo círculo da Feira, posteriormente, de Vila Nova de Gaia, Viana do Castelo e Aveiro. Após casar com Maria Emília Seabra foi eleito 6 vezes (1870-84) pelo círculo de Anadia. Este último facto levou a que o panorama político no concelho de Anadia, fosse marcado por um certo caciquismo, até ao século
XX. Porque José Luciano Castro era o chefe do Partido Progressista, e quem governava era quem José Luciano de Castro apoiava.

Após a sua morte os monárquicos juntaram-se em torno do Marques da Graciosa. A possível implantação da República agitava a população, que a 31 de Janeiro de 1891, perante a possibilidade da implantação do novo regime esperava ansiosamente o comboio em Mogofores para ter acesso aos jornais do Porto que traziam as noticias. No entanto o fracasso, a Câmara Municipal demonstrou-se fiel a família real. Antes da implantação da República a imprensa foi muito usada para difundir os ideais republicanos, “abrir” as mentes da população e demonstrar o quanto a monarquia se tinha tornado obsoleta e
inoperacional, incapaz de resolver os problemas graves que assolavam a nação.